A cultura de se destruir a cultura, o caso do Sistema de Bandas de Música do RN

Este fim de ano participei de um momento maravilhoso: uma audiência pública em que vários músicos de bandas (filarmônicas) de vários municípios de nosso Estado, se reuniram para discutir a constituição de um Sistema de Bandas de Música do RN, uma tentativa de dotar esse setor de uma organicidade mínima no âmbito da estrutura estatal. Não se tratava de criar órgãos, produzir novos gastos. Apenas garantir que o Governo do Estado, ao instituir o Sistema, começasse a produzir uma política oficial para este setor cuja presença na vida dos cidadãos acumula mais de 100 anos de história. Eu mesmo sou daqueles que, em qualquer tempo, ao se deparar com uma dessas bandas, para e fica encantado vendo crianças, jovens, adultos e idosos, juntos tocando e enchendo o ambiente (qualquer que seja ele) de música...de sons e silêncios partejadores de emoção.
Por iniciativa do Deputado Fernando Mineiro (PT) a audiência foi bela, com homenagens a velhos mestres de banda, apresentações de algumas bandas tradicionais de nosso Estado. E a certeza de que a proposta teria aprovação tanto dos parlamentares como da governadora do Estado (já que a Secretária "Extraordinária" de Cultura do Estado, Sra. Isaura Rosado, encontrava-se na dita audiência e lá manifestou sue apoio), pairou entre todos nós.
A proposta, de fato, foi aprovada por unanimidade na Assembléia Legislativa, mas ao chegar no gabinete da Governadora foi vetado integralmente, sob o argumento de ser inconstitucional, pois tal iniciativa (por caracterizar alteração nas estruturas administrativas do Estado) não competiria ao legislativo e sim ao Executivo. Não houve questionamento do mérito da iniciativa.
Assim sendo, ainda quero crer que, em sendo fiel ao argumento, logo que o período legislativo de 2012 se iniciar, a Governadora enviará mensagem criando o tão almejado Sistema. Uma luta de todos que reconhecem nas bandas (especialmente aquelas do interior do nosso Estado) as verdadeiras Escolas de Música da imensa maioria de nossos músicos.
Abaixo publico opinião tornada pública pelo amigo e maestro Bembém Dantas (regente da Filarmônica de Cruzeta, vide postagem anterior sobre seu aniversário de 25 anos), a respeito da atitude da Governadora. A carta diz tudo...

"Amigos (as ) colegas de luta e de arte!

Estamos perplexos, atônitos, inconformados com o fato da Governadora Rosalba, que  em atitude, parece-nos, carente de informação, vetou o projeto de lei, que cria o Sistema Estadual de Bandas de Música do Rio Grande do Norte - SEBAM-RN. Essa demanda, que é profundamente popular e de interesse público, partira dos próprios mestres, maestros, músicos, gestores de bandas, pais, professores. Foi apresentada pela AMUSIC (Cruzeta) e a União das Bandas do RN- UNIBAM-RN, ao deputado Fernando Mineiro que, depois de estudá-la, procurou-nos e se dispôs a organizar uma audiência pública, para que se pudesse discuti-la e fortalecer a idéia junto à sociedade, tomando como exemplo, o vizinho estado do Ceará, que desde 2006 implantou o SEBAN-CE, com resultados que apontam um avanço significativo para a música daquele Estado, colocando-o hoje no cenário nacional, como um exemplo a ser seguido.
Na audiência pública, realizada em 6 de outubro estavam presentes, além do presidente da ALRN,  deputado Ricardo Mota, a deputada  Márcia Maia, os deputados Marcelo Dantas e Hermano Morais,a Secretária Especial de Cultura Isaura Rosado, a Coordenadora Nacional das Bandas do Brasil, Rosana Lemos (MINC/FUNARTE), o professor Ronaldo Ferreira Lima – UFRN, Dr. Claudio Galvão, o maestro Antonio Pedro Dantas Filho, de 96 anos, filho do ícone da música potiguar Tonheca Dantas, a UNIBAM-RN, AMUSIC- Cruzeta, além de maestros, músicos e gestores de oitenta e três bandas de música do Estado,  entre outros tantos militantes e representantes do setor cultural do RN. Foi sem dúvida uma tarde inesquecível e histórica para a cultura do Rio Grande do Norte.
A professora Isaura Rosado, Secretária Especial de Cultura do Estado do Rio Grande do Norte,  na sua fala, depois de assistir ao concerto da Banda de Cruzeta –( 25 anos )e da Banda Euterpe Jardinense, de Jardim do Seridó- (155 anos), referiu-se à proposta com muitos elogios e parabéns, destacou a importância das bandas de música para a vida cultural do Rio Grande do Norte, colocando-se, enquanto governo, ao nosso dispor, inclusive já apontando a destinação de 5% dos recursos do FEC, quando implantado para o nosso setor. Enquanto isso, o deputado Ricardo Mota, presidente da ALRN, pronunciou-se garantindo a aprovação do projeto de lei e enfatizando o significado daquela ação, para as mais de cem bandas espalhadas por todas as regiões do Estado. Em nenhum momento foi levantado qualquer problema legal, até mesmo pelos assessores jurídicos da Assembléia Legislativa.
De fato, o deputado Fernando Mineiro e Ricardo Mota cumpriram com a sua palavra: o projeto, depois de passar por análise das devidas comissões daquela casa, foi a plenário, votado e aprovado por unanimidade. Logo após, o  governo mandou sem mais delongas nem discussão com a classe artística, o projeto de lei que cria o FEC. Na distribuição dos recursos constava aqueles irrisórios 5%, assunto esse discutido entre os responsáveis pelas bandas de música do Estado, onde tentávamos aludir o governo para destinar 15%, para as 115 bandas em atuação no RN. Mostramos que nas suas escolas, as bandas envolvem cerca de 10.000 estudantes de música, no interior do estado, Natal e região metropolitana, inclusive apresentamos propostas e um projeto intitulado NOSSA BANDA, com a divisão do Estado em 9 pólos musicais, implantação do EXPRESSO  DA BANDA (escola itinerante), realização de seminários de capacitação técnica, palestras, concertos, encontros de bandas, festivais, gravações etc. Consta que a Secretária de Cultura, a professora Isaura Amélia, gostou muito do projeto e se prontificou, em discuti-lo e somar esforços para implantá-lo. Segundo ela, após ser criado o FEC. Todos lembram que não conseguimos os 15% e para muitos puristas, a discussão de que era “muito para quem dizia não ter nada”, celebrava a batida do martelo em torno do assunto. Nesse dia 19/12 a governadora Rosalba, num evento em Campo Grande, citou o maestro Ranieri Soares (segundo o próprio) em seu discurso, enfatizando a importância das bandas e dos recursos do FEC, que seriam destinados ao SEBAM-RN. Hoje 20/12, às 8h30min, a notícia do veto, nos pegou de surpresa e de certa forma frustra a nossa alegria de espírito natalino e boas festas, quando comemorávamos um ano de tantas lutas e realizações históricas, pelo reconhecimento do governo, para com as nossas instituições.
Estamos pasmos, atônitos, aturdidos mesmo!   
A professora Isaura Rosado, que antes tinha afirmado que a governadora iria sancionar a lei, teve a gentileza de ligar para o signatário da presente, e já prevendo a nossa reação frente aos fatos, paciente e respeitosamente tentou tranquilizar-me e, em conseqüência, tranqüilizar o mundo musical das Bandas de Música do Estado. Explicou que se tratava de uma questão jurídica que ela não entendia bem - assim como eu - e que o Governo encaminharia o seu projeto de lei à Assembléia Legislativa, seguindo os mesmos moldes e modelo do apresentado pelo deputado Fernando Mineiro, debatido e aprovado por unanimidade pela ALRN no dia 25 de novembro. Na nossa visão e entendimento e baseado em argumentos de alguns advogados, a alegação do Governo para vetar o Projeto de Lei, não tem fundamentos legais. Até porque não se cria cargo algum e sim, autoriza o governo a criar o SEBAM-RN. Então porque vetar?!  Ninguém sabia?! Inclusive a própria governadora, que ontem afirmava em Campo Grande, apenas da importância dos recursos que o SEBAM receberia?! 
E, sendo assim, queremos externar a nossa decepção e dizer que não temos partidos, nem simpatias. Nosso compromisso é com o ensino da música no Estado. Esse trabalho vem sendo feito há mais de cem anos pelas bandas de música e suas escolas de formação, suprindo historicamente a ineficiência dos governos na tarefa de levar à sociedade uma formação musical, educativa e cultural, ineficácia esta que resulta no tipo de música que se produz atualmente neste Estado e que domina todos os meios de difusão de massa e até as rádios e TVs comunitárias.
O momento exige que as Bandas e suas escolas se capacitem e se equipem mais, para atender a evolução do mundo globalizado. Temos no Estado o Instituto de Música Waldemar Almeida que  funciona precariamente, a EMUFRN, que abre pouquíssimas vagas por ano em relação à demanda, e o recém implantado curso de Licenciatura em Música na UERN- Mossoró. Enquanto isso as bandas, dentro das suas possibilidades, incluem milhares de alunos, mesmo precisando de tudo: melhoria ou ampliação dos seus instrumentais; ampliação e até construção dos seus espaços físicos; equipamentos; bibliotecas; material de consumo; manutenção; capacitação técnica; eventos; etc. 
Mesmos desconfiados e escaldados nas sete águas, esperamos que o VETO ao SEBAM-RN, seja mesmo um equívoco de concepção e, em última análise, esse (mais patética ainda) não esteja ligado ao fato do projeto de lei ter sido apresentado pelo deputado Fernando Mineiro, que tem se portado nesse processo como um exemplo de altíssimo espírito público, cordial, atencioso e cumprindo a sua palavra conosco, sem em nenhum momento ter colocado, nem mesmo insinuado, sobre questões que não sejam do interesse de todos nós que lutamos, vivenciamos e fazemos as Bandas de Música do RN.
Os responsáveis pelas Bandas de Música do Estado, seus alunos, familiares, a sociedade em geral, todos, esperam uma resposta para o impasse que vivemos através de uma atitude coerente que possa dirimir a frustração e decepção que vivemos no momento, em todo o território do Rio Grande do Norte. 

Cordialmente,

Humberto Carlos Dantas - Bembem Dantas

FILARMÔNICA DE CRUZETA
AMUSIC
UNIBAN-RN"

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