PROIFES e ANDES-SN: quando enfatizar diferenças é sinal de fraqueza

Em um dos primeiros episódios da série "Fallout", um soldado ("Maximus") é conduzido ao seu comandante para se explicar ante a acusação de que haveria sabotado o companheiro (recém-promovido). Ele nega, mas escuta do seu superior que atentar contra os que estão próximos é sinal de fraqueza e não de força. E que para estar naquela unidade de combate haveria de ser capaz de enfrentar os inimigos e não os parceiros. 

Por vezes, confundimos inimigos e adversários. E transformamos artificialmente pequenas escaramuças em grandiosas batalhas de vida ou morte. E enquanto nos dividimos e mergulhamos em nossas refregas, o inimigo se banqueteia e se organiza para nos derrotar.

Na história política de nosso país (e do mundo), entre as esquerdas, se repete uma clivagem clássica: de um lado, estão os "revolucionários", os "legítimos defensores dos trabalhadores" e os "puros"; do outro, os "renegados", "reformistas", "força auxiliar dos patrões" e "infiltrados dos governos" e coisas que o valha...

Um maniqueísmo folhetinesco, que espreme um conjunto diversificado de questões em duas vielas ("revolucionários" e "traidores"). As duas vielas são ruas de um mesmo lugar: aquele que exprime nossa dificuldade em sermos engenheiros (para construir pontes) e nossa facilidade de fabricarmos bombas. Nesse lugar, há um camarote onde a direita bebe uísque, assistindo a esquerda se atacar mutuamente.

Foi assim no período pré-Guerra Civil Espanhola, nos anos 1930; no Chile, em 1973; no Brasil da ditadura militar. Parte de nossas cicatrizes são dos cigarros que queimamos uns nos outros.

A disputa entre ANDES-SN e PROIFES é rescaldo de disputas que se entranham na história recente de nossa esquerda brasileira. Tentarei recuperá-la brevemente, com as contribuições de Flávio Fontes (texto a ser publicado).

Lá em 1991, dentro do PT assiste-se um intenso debate entre suas várias tendências sobre as estratégias a serem assumidas pelo partido em face da derrota eleitoral em 1989 e o pouco avanço em 1990. Ganha força a tese de que a vitória eleitoral implicaria ampliar o arco de alianças, fazer movimentos de aproximação com segmentos não mais apenas da própria esquerda.

Nessa disputa interna, correntes como a Convergência Socialista (CS), Democracia Socialista (DS) e O Trabalho (OT) se erguerão contra essas posições, por entenderem que dessa forma o partido estaria se afastando das concepções revolucionárias que o haviam alimentado originalmente.

Inicia-se um processo que redunda na saída do PT das tendências Convergência Socialista, Causa Operária (CO) e a Tendência por um Partido Revolucionário (TPOR), em 1992. Dessas saídas, nascem dois novos partidos: o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), fundado em 1994, e o Partido da Causa Operária (PCO), em 1995. 

A esse campo anti-PT se somarão grupos que refundaram o atual Partido Comunista Brasileiro (PCB), registrado em 1996, além dos grupos que, em 2004, fundam o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), como desdobramento, principalmente, das divergências em relação à Reforma da Previdência conduzida pelo Governo Lula, em 2003, o que implicou na expulsão de Heloísa Helena, Babá, João Fontes e Luciana Genro, das hostes do PT.

No campo sindical, essas diferenças terão repercussões operando na criação de outras centrais sindicais, articuladas no campo da esquerda, para além da CUT. Nesse período irão se formar a CSP/CONLUTAS e a CTB. Importante lembrar que hoje, no Brasil, temos 9 centrais sindicais, alinhadas, em maior ou menor grau com grupos partidários - e não apenas da esquerda, vale lembrar. 

No nosso terreiro do movimento sindical docente do ensino superior, essas divergências afetarão o ANDES e terá papel importante no surgimento do PROIFES. 

Entre o final dos anos 1980 e ao longo dos anos de 1990 e início dos anos 2000 o ANDES esteve dividido entre a corrente ANDES-AD e uma oposição que assumiu os nomes de Andes Hoje, Fórum Andes Plural e ANDES-SIND.

A vitória de Lula, em 2002, representou um novo capítulo nessa história de conflitos, opondo, de um lado, aqueles que entendiam que o novo governo era mais uma "força auxiliar da burguesia", incapaz de quebrar as estruturas de desigualdade capitalista, porque rendido aos arranjos da democracia liberal-burguesa. De outro lado, aqueles que compreendiam que o contexto histórico havia mudado - a correlação de forças mais favorável à luta por avanços sociais e democráticos, ao mesmo tempo em que o esgotamento das estratégias de luta sindical restritas às paralisações. A conjuntura era outra, o novo governo representava avanços, o que implicava na necessidade de mudanças nas estratégias de luta reivindicatória.

A partir de 2004, configura-se dois campos distintos em nosso movimento docente: ANDES e PROIFES.

O PROIFES enfatiza a negociação com o governo federal, se aproximando dos grupos sindicais identificados com o PT, PC do B e CUT. O ANDES enfatiza a greve, rompe com a CUT em 2005 e se filia oficialmente à CONLUTAS em 2007, entidade que em 2010 se transforma em CSP-CONLUTAS, hegemonizada por grupos do PSTU e PSOL, além de setores mais à esquerda do próprio PT. 

Um exemplo dessas diferenças foi o processo de lutas vivido em 2012, em que de um lado, o PROIFES defendia o encerramento da greve com a assinatura de um acordo que representava ganhos reais em termos de reestruturação da carreira e a incorporação dos penduricalhos (gratificações) ao corpo salarial. Do outro lado, o ANDES-SN mantinha-se aferrado à não reconhecer esses avanços e manter a greve. A história mostrou quem estava com a razão.

No campo político mais amplo, outro momento definidor das diferenças dessas leituras, se deu quando a CSP/CONLUTAS considerou que a deposição de Dilma Roussef era expressão de um movimento da oposição de direita em tirar do poder um governo que não mais lhe servia como auxiliar de suas políticas. Na lógica de "todos são farinha do mesmo saco", defenderam o "Fora Todos". A história, mais uma vez, mostrou o significado dessa posição.

A discussão sobre (des)filiação do ADURN ao PROIFES, neste momento, só serve para alimentar mais esta história de divergências. Pouco serve, ao que parece, para discutirmos o que de fato tem nos mobilizado que é a recomposição do orçamento das universidades e os ajustes na carreira.

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