O reparo, o grotesco e mais luzes sobre o Conselho Estadual de Educação

A profa. Cláudia Santa Rosa, através de comentário enviado após a publicação de nossa postagem anterior (https://quixotesforrosebaioes.blogspot.com/2018/12/hora-de-jogar-luzes-no-conselho.html) questionando os critérios  de escolha dos membros do Conselho Estadual de Educação (CEE), esclarece que sua indicação foi feita em substituição à dispensa de outra pessoa e que, dessa forma, não teria havido a quebra do Regimento do CEE.
Agradecemos o comentário da professora e com a mesma firmeza com que escrevemos o equívoco, publicamos o seu comentário e fomos até o Diário Oficial onde, de fato, há a dispensa de uma conselheira, na mesma data de sua nomeação. E, aqui, meu pedido público de desculpas em divulgar a notícia de forma incompleta.
Mas penso que a secretária deveria ter tido o mesmo cuidado ao publicar, na página da SEEC, um arquivo (http://www.adcon.rn.gov.br/ACERVO/seec/DOC/DOC000000000190090.PDF), no qual o Conselho encontra-se com 13 membros (em razão de seu nome constar na lista) e não 12, o que atenta contra o regimento do CEE, como abordei no artigo anterior. Um erro igualmente grotesco, convenhamos...
Mas, possibilitar à própria secretária esclarecer esse aspecto fez o artigo cumprir uma parte de seus objetivos.
Reparo feito, vamos ao que interessa, de fato, e que é o centro de minha argumentação no artigo anterior.
Afinal, o critério de escolha dos conselheiros desse nosso CEE obedece a critérios republicanos ou democráticos? Essa é a questão que consome três quartos do artigo e sobre o qual o silêncio da secretária apenas joga mais luzes sobre ela.
Gostaríamos de ver o debate sobre isso aceso, afinal, como bem disse a nova conselheira "quem disso usa, disso cuida". Quem usa, se preocupa, se compromete com os rumos da educação de nosso estado e de nosso país, se envolve, e se "mete" nos processos, mesmo (e principalmente) em razão da necessidade de que se não nos metermos (com nossas ideias e concepções), outros se meterão e darão o curso que entenderem ser os mais apropriados, o que revela, como afirmei anteriormente, que não há nada de "técnico" (no sentido asséptico da palavra) na escolha desta ou aquela pessoa para ocupar um lugar num espaço educacional.
Esses "cuidadores" não devem, nem deveriam, ser escolhidos pelos caminhos e desejos que frequentam os corredores do gabinete do governador, da SEEC ou nas salas do próprio CEE. Primeiro, porque essa dinâmica, supõe que apenas nas relações que se estabelecem nesses espaços é que se constituem as competências necessárias para a ocupação de um lugar como o CEE. Uma visão que remonta aos tempos em que nossas elites sequer conheciam o liberalismo clássico (nascido com cheiro de republicanismo) e reproduziam no espaço público o modus operandi político pautado em redes e laços de lealdade privadas.
Segundo, porque ao isolar a sociedade civil da participação do processo, não apenas supõe a sua incapacidade em escolher os "mais competentes", como potencializa a predominância de uma única visão pedagógica, dado que a escolha se deu a partir de uma única visão política.
Aqui, mais uma vez, devemos deixar claro que não dissociamos a dimensão pedagógica da dimensão política, por mais que alguns generosos (e ingênuos) educadores acreditem nessa dissociação, alimentados por outros educadores, não generosos, mas cientes da falácia que distribuem e vendem por aí. (Aliás, embotar essa relação tem sido um dos mais hipócritas pilares dos defensores do movimento autodeclarado "Escola Sem Partido", que diz combater ideologias nas escolas, sem se assumir como "ideológico")
Atribuir o atual esquema de nomeações para o CEE como uma prática oriunda de um pré-liberalismo de nossas elites seria não perceber que os rios não são os mesmos, ainda que inelutavelmente deságuem no mar.
Nas águas dos rios que nos circundam, emergiu o neoliberalismo e sua insígnia de que rotinas, práticas e processos próprios do mundo privado - leia-se, aqui, não mais no sentido do interior dos laços de parentesco ou de amizade, mas das dinâmicas do mercado e da economia capitalista - seriam mais eficazes e eficientes que aquelas consagradas nos espaços públicos do republicanismo clássico que mais incorporou os princípios democráticos da transparência, da abertura aos contraditórios, e da mais ampla participação social.
Sua tradução, no âmbito educacional, implicou no questionamento à valorização de processos e mecanismos decisórios que buscam dialogar amplamente com os coletivos sociais, submetendo-se, portanto, às intempéries do debate entre contraditórios e, assim, aprendendo e desenvolvendo uma cultura de construção de consensos (sempre provisórios).
Assim, como acontece na lógica do mercado, decisões sobre como atender melhor o "cliente" não poderiam vir de uma cadeia de mecanismos e processos que pudessem conter, pelo menos, representantes desse "cliente", já que a ele cabe, tão somente, consumir o que de melhor pode ser oferecido (no máximo, pode reclamar do serviço oferecido em Serviços de Atendimento ao Cliente), já que a decisão sobre o conteúdo e a qualidade do que pode ser oferecido está exclusivamente nas mãos de quem oferece o serviço.
Por essa lógica, os gestores da educação pública (e os conselheiros do CEE também o são), não precisam ter laços de representação com a sociedade, mas "apenas" conhecer o que seria "mais adequado" para a melhor prestação do serviço educacional. Esse modelo de gestão, portanto, não prescinde da participação ativa da sociedade, senão apenas para uma eventual escuta (quando assim os gestores entendem que seja necessário).
Isso sim, ao meu ver, é "grotesco", mas foi essa lógica que esteve presente em toda a gestão da professora Cláudia Santa Rosa, acolhendo e permitindo que instituições privadas assumissem a coordenação de processos formativos de nossos professores e gestores, como foi o caso, principalmente, das escolas de tempo integral criadas recentemente.
Tanto pouco apreço pela construção coletiva e democrática da condução das políticas educacionais, em nome do acolhimento de instituições privadas, ficou evidente no desprezo da SEEC para com o Forum Estadual de Educação (igualmente órgão incluso na estrutura da Secretaria, mas com uma composição mais aberta à sociedade civil). Mas só essa questão já mereceria um artigo à parte. Fica para outra oportunidade.
Para os objetivos do presente artigo, basta que deixemos claro que a discussão mais importante não é se a professora Cláudia Santa Rosa (assim como todas as demais pessoas que compõem o CEE) teria ou não méritos pessoais para estar ali, pois sob um determinado ponto de vista, sem dúvidas que cada um dos membros do CEE tem algum mérito (além do que estaríamos sendo traídos pela "fulanização" das questões, tão próprio ao universo privado). O que importa é que o processo que tem sustentado a sua e todas as indicações anteriores, assenta-se exatamente em UM ponto de vista sobre as competências necessárias para estar ocupando aquele espaço.
Há razões históricas, políticas e pedagógicas para que a nova equipe da SEEC envide esforços no sentido de se modificar esse processo, tornando-o mais transparente, mais democrático, mais participativo. E discutir essas razões já dá um novo artigo.

Comentários

Unknown disse…
Valeu meu caro professor.
São por essas atitudes que esperamos em um novo governo estadual.

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