Ah...os deuses do futebol


Ah, os deuses do futebol...caprichosos, desfiam sua misteriosa lógica, ora para axincalhar, ora para oferecer lições aos humanos, sempre tão ciosos de se acharem responsáveis lógicos pelas tramas que se desenrolam nos gramados. Pois não é que ontem, mais um capítulo foi escrito por esses deuses, nos deixando com o sabor de místicas que tornam o futebol algo bem mais palatável que apenas um esporte e entretenimento?
Um clube grandioso, cujas estantes compõe-se de todos os títulos possíveis a um clube de futebol, iniciava o ano exposto ao sorriso humilhante de uma torcida cuja identidade primeira, muitas vezes, é, exatamente, o de ser anti-aqueleclubegrandioso.
Para os seus fiéis seguidores, este ano se iniciava com a marca das dores e sofrimentos continuamente antecipados pelos gestores recém-eleitos, recitados como se conta um rosário infindo. E com esse espírito, foram chegando operários a se juntarem aos meninos saídos das categorias de base para defenderem um mínimo de dignidade rubro-negra. Pareciam abandonados pelos deuses, entregues à própria sorte e à lógica dos humanos.
Após o acúmulo de batalhas perdidas e dois comandantes demitidos, abrem-se as portas para um novo comandante, já tido como a única estrela reluzente de um grupo de jogadores abatidos e apagados.
Enquanto o tal comandante desfiava suas tristezas públicas de que o grupo de operários não conseguia entender suas concepções de futebol, um dos operários mais antigos do clube, no anonimato de seu cotidiano trabalho de auxiliar de comandantes, elaborava seus conceitos e ideias sobre o que estava acontecendo, cumprindo, religiosamente seu discreto expediente. Não exigia lugar. Não exigia vez. Apenas auxiliava, com o tempero dos velhos marinheiros que conheceram tempestades e calmarias e, mesmo não comandando navios, não deixavam de ter olhos de navegadores.
Um dia, em jogo contra outro rubro-negro, algo como um cataclismo se abatia sobre todos. Depois de estar ganhando de 2 a 0, o time sofre um súbito revés, diante de seus torcedores e é humilhado pelo adversário, recebendo uma virada com o dobro de gols que havia feito. O então estrelado comandante abandona o barco e numa tentativa de explicação acusa que suas ideias não eram compreendidas pela tripulação.
É nesse momento em que os comandantes amedrontados abandonam navios, que os velhos marujos emergem das sombras e se tornam verdadeiros capitães. E no caso dos rubro-negros, o velho marujo por nome Jayme, sob as bençãos de velhos companheiros de jornada, acolhe a tripulação atordoada e desvalorizada, com suas dificuldades e potencialidades, com simplicidade e tranquilidade irritantes para os ansiosos inveterados.
Os adversários em coro anunciavam o enredo trágico (mas saboroso em suas bocas de mal agouro) da queda e afundamento rubro-negro.
Mas os deuses do futebol são sábios e justos. E escolhem os percursos e personagens mais improváveis para afirmarem sua soberania.
O horizonte de rebaixamento para a 2a divisão do Campeonato Brasileiro e eliminação precoce da Copa do Brasil estava posto na lógica humana que presidia os desejos dos adversários. Restava aos rubro-negros a esperança em qualidades pouco técnicas, como a garra, a determinação, ânsia em superar os sorrisos que anunciavam quedas e humilhação.
Logo, a trama rubro-negra passou a ser pontilhada por “milagres”, eliminando, fase após fase, os times que lideravam a competição paralela e mais importante. Os deuses, caprichosamente, começaram a escrever uma nova linha para a trama cantada como trágica pela torcida arco-íris.
Primeiro, na última partida contra o Cruzeiro, fez com que o único gol necessário à classificação fosse feito por um pai preocupado com o filho hospitalizado, já nos minutos finais da partida. E a
Contra o adversário seguinte, os deuses foram mais generosos ainda: fizeram com que o mais expressivo operário do time (não coincidentemente apelidado de Brocador) fizesse três dos quatro gols e ainda permitisse que o aniversariante do dia – o mais experiente de todos – pudesse comemorar aniversário, gol e classificação, assim, tudo junto, com aquela imensa torcida já ciente de que a trama urdida contra ela começava a se desfazer e ser refeita com tintas alegres e espátulas e pincéis carregados de esperança.
Após colocar mais um dos primeiros colocados do campeonato da 1a divisão no caminho dos (agora esperançosos) rubro-negros, os deuses resolvem escrever o capítulo final dessa história com o traço fino da ironia. A decisão da Copa do Brasil se dá contra o mesmo rubro-negro em cujo jogo o tal comandante estrelado resolve largar tripulação e embarcação à deriva.
Os deuses do futebol são caprichosos e irônicos. Os sorrisos humilhantes da torcida arco-íris foram engolidos pelo oceano rubro-negro que inundou os dois palcos das cenas finais dessa trama escrita com esmero.
E o desacreditar deu lugar à explosões de alegria...de novo, o pai (agora menos preocupado com o filho) e o mais operário de todos os operários, nos minutos finais da peleja, enterraram toda e qualquer réstia de esperança que ainda existia na torcida arco-íris de que os deuses se renderiam à sua pobre lógica. Aliás...entre a torcida arco-íris há um grupo tricolor que voltaram à 1a divisão do Campeonato Brasileiro, por obra e graça, não dos deuses do futebol, mas do casuísmo de alguns humanos...Faltam duas rodadas para vermos o que farão os deuses...eles estão avisando, desde algum tempo de que quem voltou
à 1a divisão contra a vontade deles pagarão aqui...aqui se fez...aqui se paga...dizem os deuses do futebol.

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