Rádio Cidade Oculta: há 25 anos em Caicó

Poucos sabem ou se lembram, mas há 25 anos, em plena Festa de Santana (como a que se encerrou semana passada) entrava em funcionamento a primeira rádio FM de Caicó. Não, não foi a Rádio Rural FM, mas a Rádio Cidade Oculta. A primeira (e talvez única) experiência de "rádio pirata" ou "rádio livre" (como o pessoal do movimento se autodenominava) de Caicó foi um desdobramento de uma brincadeira de estudantes universitários residentes em Natal.
O então estudante caicoense de Física Gilvan Azevedo e um outro estudante de Engenharia Elétrica (do qual não recordo o nome), ambos moradores da residência universitária já haviam montado o transmissor para divertimento próprio e dos residentes da Residência Campus I e II, ainda que o raio de abrangência dela (dado que a antena de transmissão ficava no alto do prédio da Residência II) abarcava boa parte dos bairros de Potilândia e Nova Descoberta. Mas a rádio funcionava esporadicamente, afinal, não era "legal" e a legislação vigente ainda era a herdada da ditadura militar, portanto, ser pego pelo órgão fiscalizado da época (o DENTEL) era cadeia certa: crime federal.
Combinamos, eu e Gilvan, de montarmos a Rádio Cidade Oculta em Caicó, naquela última semana da Festa de Santana de 1987. E assim fizemos. A casa onde instalamos a antena e o transmissor era a residência de Vital Nogueira, militante do PCdoB (hoje advogado), estrategicamente localizada em região das mais altas da cidade (próxima da Casa do Estudante). Dentro da casa, montamos o equipamento básico: o transmissor, dois equipamentos de som (com vinil e fita K7) e um microfone. De lá, lançavámos nossas mensagens e músicas.
Para divulgar a rádio fizemos o nosso "boca-a-boca", deixamos uma fita k7 tocando 30 minutos de música enquanto saíamos pelas ruas (especialmente o pessoal dos postos de táxi no centro da cidade), abordando-os (como quem nada quer) se já sabiam que havia uma rádio FM na cidade. Como já era do conhecimento geral que a Rural FM entraria em funcionamento, muitos começaram a ligar o rádio dos seus carros para sintonizarem a novidade. E aí se espalhou a notícia e a audiência.
A nossa rádio tinha todas as manhas das rádios FM: notícia, muita música e até (acreditem!) vinhetas...Utilizávamos as da Rádio Cidade de Natal e acresentávamos ao fim a expressão Oculta, para diferenciar e deixar claro nosso caráter "clandestino".
Até que algumas pessoas foram até a Rádio Rural para se informarem se era verdade que a FM deles tinha iniciado as suas transmissões. Claro que o pessoal ficou sem entender nada e acionaram o Sr. Moacir Dantas (pai de minha primirmã Graça Dantas e de meu primirmão Fabrízio Dantas), um homem cuja altura era inversamente proporcional ao seu conhecimento sobre radiotransmissão sem nunca ter feito um curso de nível superior.
Seu Moacir pôs um rastreador no seu carro e saiu pela cidade a fim de localizar a origem das ondas que emanávamos. Não tardou muito identificou-nos e, claro, reconheceu a voz do filho de Agenor - irmão de sua falecidade esposa - em uma das intervenções radialísticas.
Imediatamente, avisou aos pais do moleque que desligasse a rádio porque o DENTEL já tinha conhecimento do ocorrido e estariam vindo à Caicó para prender os responsáveis pela transgressão.
Logo que avisados (na quinta feira), resolvemos manter a programação até, pelo menos, o dia seguinte, já que no domingo voltaríamos para Natal. E naquela mesma quinta, aproveitando que nosso amigo Ailton "Suru" Medeiros estava organizando uma Festa de Rock com bandas vindas de Natal, marcams a tarde daquela quinta feira com uma programação só de Rock, com os ares de Caicó tomados por Led Zeppellin, Queen, Barão Vermelho, Scorpions, Iron Maiden, Titãs, Paralamas do Sucesso...e por aí foi.
Fechamos a rádio no dia seguinte e no domingo viajamos de volta para Natal. Dias depois soubemos que na segunda feira imediatamente posterior funcionários do DENTEL chegaram em Caicó para saberem do ocorrido e foram informados por Seu Moacir se tratar de uma "brincadeira de uns meninos de Natal que ele não conhecia". Ave Moacir Dantas!!!

P.S. Meses depois, voltamos a pôr a Cidade Oculta a funcionar. Tratava-se das eleições para o DCE da UFRN daquele ano e a chapa que apoiávamos chamava-se Outras Bandeiras, encabeçada pela minha querida Lavínia e o saudoso Rafael Freire (por onde andas, cara???). A estratégia era simples: montamos a rádio para funcionar durante os dois dias da eleição. Cada militante apoiador da chapa deveria levar um rádio para os setores de aula do Campus Central para captar nossa programação que além de música divulgava as propostas da chapa. Como o nome da chapa era "Outras Bandeiras", a rádio funcionou naqueles dois dias sob o nome de "Bandeirosa" (alusão bem humorada à sua condição de clandestina). Bons tempos do Movimento Estudantil que receberá nossa atenção na próxima postagem quando falaremos da Assembléia Geral da Saudade ocorrida ontem.

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