O Evangelho segundo o TACEJA: a angústia e o suícido de Judas


A cena é conhecida de todos. Judas adentra o palco angustiado. Uma alma atormentada que entregou o mais justo dos justos às autoridades judaicas e romanas por trinta dinheiros. Aquilo tudo lhe deixava amortecido. Aquelas moedas lhe queimavam a mão e a alma. Encontrava-se desesperado, haveria de se matar.
A estrutura cênica era simples: o ator entrava cabisbaixo, dando todas as demonstrações de angústia, típicas de um suicida. E no centro do palco praguejava a si mesmo. Aquele era o momento em que a plateia aguardava a morte do traidor do Rei dos Reis.
O acerto com o ator que interpretava Judas era claro: ele entraria em cena e após o final de sua fala, pegaria uma corda deixada num canto do palco e com ela em mãos e se retiraria da cena, anunciando o seu fim autoexecutado. O palco, deixado vazio, pela saída daquele personagem, daria lugar a um apagar de luzes e a uma sombra projetada no fundo do palco, de um enforcado, acompanhado de um grito de dor que emergia de um nada (na verdade, das coxias...rs).
Gilvan, o ator, ao encerrar a lamúria de Judas, olha para o fundo do palco com a certeza (que sempre tinha) de que pegaria a corda e sairia aos brados em direção à morte, mas percebe - agora, sim, bem angustiado - que a corda não estava lá...naquele dia, esse detalhe havia escapado ao diretor, ao contra-regra, aos atores...a todos...esqueceram de pôr a corda...a cena estava incompleta...e Judas sem condições de se matar como estava escrito nos evangelhos, nas profecias...como todos da plateia tão ansiosamente aguardavam...em questão de segundos a angústia do ator aumenta: como "seu" Judas morreria agora? Ao olhar para o lado, pôde ver na coxia o diretor da peça - "Pedão" Idelfonso - igualmente atordoado com a possibilidade de que o maior traidor da história poderia não morrer como todos sabiam e esperavam...A orientação dada pelo diretor - "vire-se!!!" - era claríssima (a ponto de que Gilvan nem precisou fazer a leitura labial, pois os gestos do diretor foram mais claríssimos ainda).
Naquela noite o ginásio de esportes do Centro Educacional José Augusto assistiu uma releitura livre do suicídio de Judas como nunca antes havia sido afirmado pelos evangelhos. Uma outra morte. Tosca, é verdade, mas menos violenta do que se supunha. Judas olha fixamente para a plateia com um ar sombrio e após bradar um "como estou desgostoso!!!", conduziu as próprias mãos a apertarem o próprio pescoço e de lá saiu autosufocando-se até o momento em que, aí sim, todos puderam ouvir um grito de dor com o qual identificaram que, sim, Judas havia se matado...E a profecia pôde, enfim, se realizar.
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No mais, nesses tempos de reforço da fé entre os cristãos, o Espaço Cultural Virtual Cine Rio Branco apresenta uma belíssima obra do argentino Ariel Ramirez (morto em fevereiro de 2010), o seu "Gloria", da "Misa Criolla".Trata-se de uma versão "criolla" (leia-se baseada nas tradições dos povos originários da América do Sul) de um código religioso tipicamente ocidental e cristão. Uma versão lindíssima foi gravada por Mercedes Sosa, mas aqui temos uma apresentação ao vivo com o Grupo Los Fronterizos e o Coro da Catedral de San Izidro, feita em homenagem ao Monsenhor Tércio, da Paróquia de São José, de Caicó, num dia em que alguns populares locais dizem ter visto anjos pousados sobre o teto da Igreja ou fazendo razantes para as crianças que brincavam próximas dali.

Comentários

Darli disse…
Bem que estava precisando de um incentivo para umas boas risadas as quais a inusitada cena "de Judas angustiado em seu pitoresco suicídio" me proporcionou...kkk
Ana Pimenta disse…
A encenação foi hilária, realmente tosca, mas rendeu-me muitas gargalhadas, kkk... Adorei!!! Quanto à versão da “Missa Criolla” - Glória (Ariel Ramirez), apresentada pelo Grupo Los Fronterizos e o Coro da Catedral de San Izidro, achei emocionante a expressão do rosto dos cantores, as vozes “quase” que num uníssono e a desenvoltura dos músicos ao tocarem seus instrumentos, magnífico, adorei... Lindo!!! Obrigada.
Adriana disse…
Pense como gosto dos seus contos,ditos e desditos rendem boas risadas.

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