Insegurança Pública no meio rural...

Meu domingo começa com uma triste notícia recebida de Luana, clarinetista da Filarmônica Eco da Terra, do assentamento Modelo, de João Câmara. Segundo me informa, computadores de um projeto de inclusão digital em desenvolvimento há seis meses, equipamento de som da banda, contra-baixo e guitarra...tudo roubado de dentro da sala onde ficavam para o usufruto das crianças, jovens e adolescentes da comunidade.
A insegurança graça no meio rural potiguar e o tema recentemente recebeu uma abordagem do professor Edmilson Lopes Júnior em artigo publicado no sítio do Deputado Mineiro, do PT, intitulado "Segurança Pública e Desenvolvimento Rural".
Os casos de violência que importam à mídia e ao poder público parecem se restringir àqueles que envolvem os movimentos sociais (o MST, especialmente), a partir de uma ultrapassada visão de que problemas sociais são, em última instância, resolvidos pela ação policial. Mas, como bem apontou Edmilson, o cotidiano violento no meio rural não é ocupado pelas atividades políticas dos movimentos sociais, mas principalmente por uma bandidagem que não se vê alcançada pelo poder público ao se embrenhar pelas zonas rurais de nossas cidades do interior. Lá, não há polícia, muito menos qualquer tipo de organização de defesa comunitária (quando muito, a contratação de segurança privada pelos grandes fazendeiros) que possa assegurar um mínimo de segurança pública.
No descaso para com a denúncia e enfrentamento dessa violência no campo está presente uma idealização: a de que o mundo da vida do campo é regido por uma paz e tranquilidade típicas da "vidinha de interior", consumada em relações de boa vizinhança e compadrio que são comuns nesses ambientes. Mas, a ausência de qualquer política também é o desdobramento de uma compreensão que pensa apenas o mundo urbano como objeto de políticas. O mundo rural seria apenas alcançado pelas políticas de forma episódica, residual ou setorial (nos casos em que se tenha a produção de dividendos econômicos).
Um dos desafios postos para todos nós (e não apenas para os que moram no campo) é viabilizarmos uma civilização na qual viver no campo seja tão bom quanto viver na cidade. Esse equilíbrio refletiria em várias dimensões, das quais cito duas que me vem a cabeça agora: a desconcentração populacional urbana de capitais e metrópoles (hoje imersas em uma duvidosa qualidade de vida da população economicamente espoliada) e a redução do custo dos alimentos a partir do incentivo à produção agrícola nessas comunidades.
A violência vivenciada em Modelo não se tratou apenas de um roubo à particulares, mas a uma comunidade inteira. Os computadores e os instrumentos musicais auxiliavam e alimentavam esperanças de exercício de direitos e de conquistas outras, tanto para as pessoas que eventualmente desejam ir embora do assentamento, como, principalmente, para aqueles que sonham viver com algum grau de dignidade pertinho de familiares e amigos que aprenderam a cultivar desde que ocuparam aquele latifúndio e resolveram que daquele "nada" haveria de emergir uma comunidade de gente que sonha, brinca, trabalha...vive.
Abraços a todos e todas, com muita tristeza.

P.S. Alguns minutos depois de escrever este texto desabou água por aqui...Muito desconfio que era Santa Luzia (a santa dos olhos, que empresta seu nome à Agrovila onde fica a Filarmônica) chorando as perdas do pessoal de Modelo II.

Comentários

ruyrocha disse…
Fico triste com o ocorrido. Mas que a tristeza se converta em esperança. Vamos reconstrui o que nos foi roubado. Conte comigo nesta empreitada.

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