Sobre o papel da mídia televisiva na prevenção de tragédias como as do Rio
As recentes chuvas que transformaram municípios de São Paulo e Rio de Janeiro em um caos, demonstram a incapacidade de governos e sociedade como um todo em se relacionar equilibradamente com a natureza. Afinal, sempre houve e sempre haverá enxurradas como essas porque é uma forma da natureza se reorganizar ciclicamente. Assim, são, também, os terremotos...ajustes que a própria natureza faz em si mesma, para que ela se mantenha equilibrada. E para isso ela não pede licença aos seres humanos que, mais ou menos agressivamente, resolveram construir casas, edifícios e descuidar do próprio lixo por eles criados.
A única alternativa para se conviver com esses fenômenos é, de um lado, adotarmos novos hábitos como a redução da produção do lixo; o exercício do reaproveitamento máximo de todo e qualquer resíduo sólido; a racionalização do consumo de energias; entre tantas orientações que são repetidas, mas pouco exercitadas.
De outro lado, é importante um sistema de prevenção à desequilíbrios climáticos como esses que estamos vendo. Nesse sistema, o papel dos governos é fundamental, principalmente executando obras de proteção à população e realizando ações que impeçam o aumento da agressão humana à natureza.
Reproduzo aqui um artigo que mostra o papel que os meios de comunicação tem nesse processo e que já poderia ser realizado, contribuindo para a redução dos dramas que temos assistido...O texto é de Laurindo Lalo Leal Filho, e foi publicado na Agência Carta Maior.
"Todas as redes comerciais de televisão no Brasil têm as suas moças do tempo. São herdeiras, em São Paulo, do Narciso Vernizzi, o primeiro “homem do tempo” da rádio Jovem Pan.
Elas surgem do nada, entre uma notícia e outra, aparecem no canto da tela e caminham para o centro, mostrando mais que o tempo as suas belas curvas.
Em casa, o telespectador vê atrás das moças as indicações do clima e da temperatura em todo o Brasil. Com algumas variações, esse tipo de informação é universal. O canal mundial da BBC mostra o tempo em várias partes do mundo, sem as moças.
São informações úteis, mas limitadas. Ajudam a sair de guarda-chuva no dia seguinte ou, aos viajantes, a escolha do que colocar na mala. Não sei se informações tão superficiais e genéricas contribuem para decisões mais importantes, como dos agricultores, por exemplo.
Apesar do avanço da internet, o rádio e a televisão ainda são os mais eficientes e abrangentes serviços públicos de informação. Não há outro meio que consiga falar de forma tão rápida para milhões de pessoas ao mesmo tempo.
Em momentos críticos tornam-se imprescindíveis. Pena que, por aqui, são pouco usados nesse tipo de prestação de serviços.
No caso de tragédias, como as deste início de ano, ao invés de moças desfilando à frente de ilustrações artísticas, deveríamos ter as programações interrompidas.
Em seu lugar seriam formadas cadeias nacionais ou locais de rádio e TV, antes das catástrofes, dando orientações seguras para a população. Sem pânico, mas com precisão e firmeza. E não generalizando com frases do tipo “chove no litoral do nordeste”.
Trata-se de um de trabalho que deve ser o mais localizado possível, com o envolvimento articulado dos serviços de meteorologia, da defesa civil e do jornalismo, na produção das informações.
Quantas vidas não poderiam ter sido salvas se, em vez colocar no ar o Ratinho ou o Big Brother, as emissoras tivessem avisado à população de que fortes chuvas estavam previstas para a serra fluminense na noite anterior à tragédia, com instruções dos poderes públicos sobre como agir.
Ou, no caso, de São Paulo que vias deveriam ser evitadas na iminência dos temporais, já que não há segredo nessa cidade sobre onde se localizam os eternos pontos de alagamento.
Para obter mais eficiência, esse serviço deveria ter seu foco nas informações locais. Dai a importância da regionalização das programações de rádio e TV, tão combatida pelos concessionários do setor.
No entanto são elas que darão às emissoras regionais e locais experiência, tanto na produção como na técnica, para enfrentar com competência situações extraordinárias.
Nem todos se salvariam, é verdade. Mas, com certeza, os danos seriam menores.
Furacões violentos que varrem o Caribe todos os anos causam grandes estragos materiais em Cuba, mas pouquíssimas vítimas.
Simplesmente porque as autoridades estabelecem planos precisos para a retirada da população das áreas criticas e a orientam através do rádio e da TV, com razoável antecedência, sobre as medidas que devem ser tomadas.
Muitos navios não foram à pique na costa brasileira graças ao programa radiofônico “A Voz do Brasil”. A seção “Aviso aos navegantes” informava todos os dias, minuciosamente, as condições das bóias de luz, sinalizadoras dos perigos naturais existentes no mar.
Era o rádio atuando como serviço público numa época de recursos eletrônicos muito limitados, se comparada aos hoje existentes.
Satélites transmitem informações meteorológicas com alto grau de precisão e as redes de rádio e TV cobrem todo o território nacional.
Falta apenas articular esses dois serviços com planos nacionais e locais de prevenção à catástrofes naturais.
No caso das enchentes no sudeste e centro-oeste, trata-se de problema datado, de dezembro a março. Há todo o resto do ano para o trabalho de planejamento e articulação.
Quem toma a iniciativa?"
Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A
TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial). Twitter: @lalolealfilho.
A única alternativa para se conviver com esses fenômenos é, de um lado, adotarmos novos hábitos como a redução da produção do lixo; o exercício do reaproveitamento máximo de todo e qualquer resíduo sólido; a racionalização do consumo de energias; entre tantas orientações que são repetidas, mas pouco exercitadas.
De outro lado, é importante um sistema de prevenção à desequilíbrios climáticos como esses que estamos vendo. Nesse sistema, o papel dos governos é fundamental, principalmente executando obras de proteção à população e realizando ações que impeçam o aumento da agressão humana à natureza.
Reproduzo aqui um artigo que mostra o papel que os meios de comunicação tem nesse processo e que já poderia ser realizado, contribuindo para a redução dos dramas que temos assistido...O texto é de Laurindo Lalo Leal Filho, e foi publicado na Agência Carta Maior.
"Todas as redes comerciais de televisão no Brasil têm as suas moças do tempo. São herdeiras, em São Paulo, do Narciso Vernizzi, o primeiro “homem do tempo” da rádio Jovem Pan.
Elas surgem do nada, entre uma notícia e outra, aparecem no canto da tela e caminham para o centro, mostrando mais que o tempo as suas belas curvas.
Em casa, o telespectador vê atrás das moças as indicações do clima e da temperatura em todo o Brasil. Com algumas variações, esse tipo de informação é universal. O canal mundial da BBC mostra o tempo em várias partes do mundo, sem as moças.
São informações úteis, mas limitadas. Ajudam a sair de guarda-chuva no dia seguinte ou, aos viajantes, a escolha do que colocar na mala. Não sei se informações tão superficiais e genéricas contribuem para decisões mais importantes, como dos agricultores, por exemplo.
Apesar do avanço da internet, o rádio e a televisão ainda são os mais eficientes e abrangentes serviços públicos de informação. Não há outro meio que consiga falar de forma tão rápida para milhões de pessoas ao mesmo tempo.
Em momentos críticos tornam-se imprescindíveis. Pena que, por aqui, são pouco usados nesse tipo de prestação de serviços.
No caso de tragédias, como as deste início de ano, ao invés de moças desfilando à frente de ilustrações artísticas, deveríamos ter as programações interrompidas.
Em seu lugar seriam formadas cadeias nacionais ou locais de rádio e TV, antes das catástrofes, dando orientações seguras para a população. Sem pânico, mas com precisão e firmeza. E não generalizando com frases do tipo “chove no litoral do nordeste”.
Trata-se de um de trabalho que deve ser o mais localizado possível, com o envolvimento articulado dos serviços de meteorologia, da defesa civil e do jornalismo, na produção das informações.
Quantas vidas não poderiam ter sido salvas se, em vez colocar no ar o Ratinho ou o Big Brother, as emissoras tivessem avisado à população de que fortes chuvas estavam previstas para a serra fluminense na noite anterior à tragédia, com instruções dos poderes públicos sobre como agir.
Ou, no caso, de São Paulo que vias deveriam ser evitadas na iminência dos temporais, já que não há segredo nessa cidade sobre onde se localizam os eternos pontos de alagamento.
Para obter mais eficiência, esse serviço deveria ter seu foco nas informações locais. Dai a importância da regionalização das programações de rádio e TV, tão combatida pelos concessionários do setor.
No entanto são elas que darão às emissoras regionais e locais experiência, tanto na produção como na técnica, para enfrentar com competência situações extraordinárias.
Nem todos se salvariam, é verdade. Mas, com certeza, os danos seriam menores.
Furacões violentos que varrem o Caribe todos os anos causam grandes estragos materiais em Cuba, mas pouquíssimas vítimas.
Simplesmente porque as autoridades estabelecem planos precisos para a retirada da população das áreas criticas e a orientam através do rádio e da TV, com razoável antecedência, sobre as medidas que devem ser tomadas.
Muitos navios não foram à pique na costa brasileira graças ao programa radiofônico “A Voz do Brasil”. A seção “Aviso aos navegantes” informava todos os dias, minuciosamente, as condições das bóias de luz, sinalizadoras dos perigos naturais existentes no mar.
Era o rádio atuando como serviço público numa época de recursos eletrônicos muito limitados, se comparada aos hoje existentes.
Satélites transmitem informações meteorológicas com alto grau de precisão e as redes de rádio e TV cobrem todo o território nacional.
Falta apenas articular esses dois serviços com planos nacionais e locais de prevenção à catástrofes naturais.
No caso das enchentes no sudeste e centro-oeste, trata-se de problema datado, de dezembro a março. Há todo o resto do ano para o trabalho de planejamento e articulação.
Quem toma a iniciativa?"
Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A
TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial). Twitter: @lalolealfilho.
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