Castanhas e Cajus
Fui provocado por pessoas próximas a postar mais atentados poéticos de minha lavra. Aqui posto uma pobre tentativa de escrever um martelo agalopado. Digo pobre porque ele não obedece ao padrão clássico do que se classifica de Martelo Agalopado (uma, ou mais, estrofe/s de dez versos decassilábicos, bem ritmado - como um galope! -, marcando tônicas nas sílabas 3, 6 e 10, cuja estrutura rímica segue o esquema das décimas dos cantadores, ou seja, ABBAACCDDC.). Podem, então, chamar o meu de "martelinho"...Eu o escrevi há anos atrás, após ouvir uma bela história de um casal de namorados que viviam em lugares distantes e ele tentou (em vão) convencer uma funcionária dos Correios de mandar via postal, uma lembrancinha dele para ela: um quilo de cajus...Resolveu, então, chupar os cajus e mandar-lhe as castanhas. Bela declaração de amor...Quanto ao poema...bem...podem comentar depois...abraços a todos e todas.
Tantos encontros cercam nossa história,
um sonho, um som, um poema, uma vitória,
um ponto, uma fala, uma carta alegre,
uma cidade do sol, uma avenida, um albergue,
a espera do tempo, o vermelho e a cereja,
os olhos atentos, as mãos, a cerveja,
os beijos intensos, os dois corpos nus,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Às vezes eu penso: parece um arranjo,
uma providência, um acaso, um plano,
um arranjo perverso dos tais orixás,
deixando promessas e fatos pra trás,
talvez um carteado jogado na mesa,
no cais de um porto a memória presa,
a manhãs, a tardes e noites azuis,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Os prédios, as praças, perderam a graça,
Perderam a cor, se encheram de traças,
Ficaram sem vida e agonizantes,
Gritavam o silêncio das pedras errantes,
Se encheram de tédio, inércia e tristeza.
Mas igual Malasartes com sua esperteza,
reavivaria os nortes e os sus,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Num dia um sonho, num outro um poema,
Às vezes lição, às vezes um lema.
Sou padre, mascate, palhaço, cantor,
Bandido, mocinho, arquiteto e ator,
Sou chão adubado, fabrico surpresa,
Às vezes eu deixo a memória acesa,
Outras eu apago junto com a luz,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Não sei se aprecias minha pobre rima,
Se ela te deixa pra baixo ou pra cima,
Se desce macia ou apimentada,
Se em desembesto ou cadenciada
Nem se sua métrica certa esteja,
dentro dela pulsa uma bela certeza,
que há muito me move, consome, seduz,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Já fui, já viestes, já fostes, já voltei,
Tantas idas e vindas, que a conta não sei,
Me perco nas teias da minha saudade,
Escapo das tramas de sua maldade,
E contemplo a lembrança de sua beleza,
Uma teimosia que beira a estranheza,
Um amor de verdade que tudo reluz,
enquanto te dou castanhas em bandeja,
sorvo o teu gosto, chupando os cajus.
Comentários
uma nova e gentil provocação.
Não se surpreenda com a colocação.
Se gritares alguns nomes ao vento,
poesias suas voltarão em procissão.
“Um surdo, um som, uma nota que te nota”,
essa boniteza cicatrizou um grande arranhão.
Poderias registrá-las todas em um livro:
“Atentados Poéticos”, um título interessante.
É apenas minha humilde sugestão.
Abraços com laços!
Neura Maria Weber Maron
Bjs