Mortes e novas vidas em vista

Esta semana tive duas notícias de morte que me deixaram muito tristes. Mortes não de pessoas, mas de experiências. Estive perto de ambas. Participei de ambas e, portanto, a morte delas é como a perda de um pedaço de mim. Uma delas foi a Escola Cooperativa, sobre a qual já postei um comentário aqui no início do ano, divulgando a todos que aqui aportam a oportunidade de matricular filhos, parentes, e filhos de parentes e vizinhos na escola. Mas eu soube que a escola não conseguiu reunir um número de estudantes que a viabilizasse. Como se trata de uma Escola Cooperativa (e não de um empreendimento lucrativo), sua manutenção dependia diretamente do número de matrículas alcançadas. Apesar da dedicação de muitos dos seus profissionais mais identificados com a causa cooperativista, não foi possível a continuidade das atividades. Uma perda para todos.
Pelo que soube, o Grupo de Teatro coordenado pela profa. Monique (que sempre teve uma relação muito próxima com a história da escola) deverá continuar no prédio desenvolvendo oficinas de arte e teatro (que já desenvolvia antes). Vida longa ao Grupo de Teatro e Honras a todos que ergueram essa experiência e a tornaram a referência pedagógica que sempre foi e que não escapa a memória de pais, professores e, principalmente, seus ex-alunos (como meus filhos).

Quanto a segunda morte, na verdade, não sei se ainda posso chamá-la assim. Talvez seja prudente, então, tratá-la entre aspas ("morte"), pois a vida sempre é tão capaz de nos desdizer (e nesse caso bem que ela poderia fazer isso mesmo).
Refiro-me à "morte" do Coral Sertão Encanto, cujo nascimento esteve umbilicalmente à minha passagem por Caicó logo que fui nomeado como professor da UFRN. O grupo iniciou-se como uma vontade de introduzir na dinâmica acadêmica do CERES uma atividade artística capaz de ampliar horizontes para os estudantes, professores, servidores técnico-administrativos e gente que não fazia parte da instituição.
No primeiro ano, tivemos o apoio decisivo do colega (e amigo) maestro André Oliveira (então coordenava o Madrigal da UFRN) que nos enviou um de seus estudantes bolsistas para nos tornar "coralistas". O estudante (José Luiz) recebia passagens de ida e volta do CERES (com o apoio fundamental da saudosa profa. Lúcia, então diretora do CERES), recebia uma bolsa da EMUFRN e se hospedava na minha casa. Dois anos depois, conseguimos nos tornar Grupo Permanente de Arte e Cultura, tendo a possibilidade de receber mais recursos da UFRN para a manutenção do grupo (que a essa altura já adquiria uma consistência muito maior).
Ao longo desse tempo, o grupo envolveu muita gente...Alguns membros do Coral tornaram-se coralistas no Madrigal, no Armus...Saí de Caicó, outros professores assumiram a coordenação do Grupo...Em 2004 o grupo sofreu um sério abalo em razão da compreensão (assumida pela direção da Proex à época e de parte dos professores do próprio CERES) que o grupo não era "acadêmico"...Numa conversa com um dos membros, compartilhando da preocupação dele resolvi enviar um projeto para o Programa Petrobrás Cultural, descrente da possibilidade de conseguir alguma coisa, dada a peneira nacional que era (e ainda é) o programa.
Surpreendentemente fomos agraciados com a aprovação e iniciamos, um ano depois, as atividades do projeto. As dificuldades não foram poucas mas conseguimos dar conta dos objetivos em grande parte.
Esta semana, o coordenador do Grupo e diretor do CERES me informou que nem ele nem nenhum outro professor topava coordenar o grupo. Também não houve muita mobilização para encontrar alternativas (nem a PROEX nem a Escola de Música foram procuradas para buscarmos juntos eventuais soluções). O grupo, por sua vez, já vinha sendo avisado dessa possibilidade há muito tempo...
A sensação que tenho é de uma conjunção trágica entre falta de vontade política, ausência de compromisso e conformismo de todo um conjunto de pessoas...Quanto a mim, pelo menos, junto com o (ex-)regente Edson Bruno, ainda tentamos, na noite da segunda feira (último dia para o envio de projetos de extensão para concorrer a recursos do Edital da PROEX), convencer algum professor da EMUFRN a coordenar o grupo...
Não foi uma boa sensação a que senti, apesar de que faria aquilo de novo em nome da solidariedade ao meu querido Edson Bruno. Mas estar ali conversando com meus colegas naquelas condições só reforçava a certeza de que não estava representando ninguém a não ser a minha própria generosidade e solidariedade ao regente...O grupo não se mexeu o suficiente para merecer isso...Eles não "morreram"...eles se "suicidaram"...e não foi por falta de aviso...

Mas há vida nova...a Filarmônica Eco da Terra, uma experiência fantástica desenvolvida pelo meu querido Ubaldo Medeiros, após as tristes notícias de não terem sido contemplados em nenhum dos editais que concorreram no ano passado (BNB Cultura, Petrobras Cultural e Pontos de Cultura), parece que receberão o apoio de uma Congregação Cristã, com o quê poderão garantir a continuidade da presença do maestro por lá. Alguns colegas professores da Escola de Música me responderam favoravelmente ao meu apelo de envidarmos esforços institucionais para realizar um trabalho mais consistente por lá.
E aí, vejo no horizonte novas vidas...e a trilha sonora pontilhada pela música dos meninos do assentamento Modelo 2, onde se cultiva música de boa qualidade, cidadania e esperança...

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