Quando começou nosso erro? texto de Leonardo Boff


Negada...

O cara aí (Leonardo Boff) é um dos maiores representantes da Teologia da Libertação. Simplesmente sentou na mesma cadeira de Galileu Galilei para encarar o Santo Ofício, quando este era dirigido pelo então Cardeal Ratzinger (atual Papa Bento XVI). Escreveu coisas que a Santa Madre Igreja não aprovou e, por isso, foi obrigado a ficar em Silêncio Obsequioso.
Fui ver a palestra e, ao seu modo "franciscano", foi simples e direto: mensagens sobre o reconhecimento que precisamos ter de que moramos (todos) na mesma casa (o planeta Terra) é ao mesmo tempo, uma percepção simples e grandiosa de nossas tarefas como moradores daqui. Cuidar de nossa Mãe-Terra, como extensão de um auto-cuidado; consumir de forma equilibrada, como forma de, ao mesmo tempo, reduzir o desperdício e inibir a superprodução de lixo; proteger a natureza e os animais, como extensão de nossa própria proteção...Enfim...o artigo abaixo (postado junto com a divulgação da palestra de ontem) vai ficar aí...Outros artigos é só acessar www.leonardoboff.com

"Sentimos hoje a urgência de estabelecermos uma paz perene com a Terra. Há séculos estamos em guerra contra ela. Enfrentamo-la de mil formas no intento de dominar suas forças e de aproveitar ao máximo seus serviços. Temos conseguido vitórias mas a um preço tão alto que agora a Terra parece se voltar contra nós. Não temos nenhuma chance de ganhar dela. Ao contrário, os sinais nos dizem que devemos mudar senão ela poderá continuar sob a luz benfazeja do sol mas sem a nossa presença.
É tempo de fazermos um balanço e nos perguntarmos: quando começou o nosso erro? A maioria dos analistas diz que tudo começou há cerca de dez mil anos com a revolução do neolítico, quando os seres humanos se tornaram sedentários, projetaram vilas e cidades, inventaram a agricultura, começaram com as irrigações e a domesticação dos animais. Isso lhes permitiu sair da situação de penúria de, dia após dia, garantir a alimentação necessária através da caça e da recoleção de frutos. Agora, com a nova forma de produção, criou-se o estoque de alimentos que serviu de base para montar exércitos, fazer guerras e criar impérios. Mas se desarticulou a relação de equilíbrio entre natureza e ser humano. Começou o processo de conquista do planeta que culminou em nossos tempos com a tecnificação e artificialização de praticamente todas as nossas relações com o meio-ambiente.
Estimo, entretanto, que esse processo começou muito antes, no seio mesmo da antropogênese. Desde os seus albores, cabe distinguir três etapas na relação de ser humano com a natureza. A primeira era de interação. O ser humano interagia com o meio, sem interferir nele, aproveitando de tudo o que ele abundantemente lhe oferecia. Prevalecia grande equilíbrio entre ambos. A segunda etapa era a da intervenção. Corresponde à época em que surgiu há cerca de 2,4 milhões de anos, o homo habilis. Este nosso ancestral começou a intervir na natureza ao usar instrumentos rudimentares como um pedaço de pau ou uma pedra para melhor se defender e se assenhorear das coisas ao seu redor. Inicia-se o rompimento do equilíbrio original. O ser humano se sobrepõe à natureza. Esse processo se complexifica até surgir a terceira etapa que é a da agressão. Coincide com a revolução do neo-lítico da qual nos referimos anteriormente. Aqui se abre um caminho de alta aceleração na conquista da natureza. Após a revolução do neolítico sucederam-se as várias revoluções, a industrial, a nuclear, a biotecnológica, a da informática, da automação e a da nanotecnologia. Sofisticaram-se cada vez mais os instrumentos de agressão, até penetrar nas partículas sub-atômicas (topquarks, hadrions) e no código genético dos seres vivos.
Em todo esse processo se operou um profundo deslocamento na relação. De ser inserido na natureza como parte dela, o ser humano transformou-se num ser fora e acima da natureza. Seu propósito é domina-la e trata-la, na expressão de Francis Bacon, o formulador do método científico, como o inquisidor trata o seu inquirido: torturá-la até que entregue todos os seus segredos. Esse método é vastamente imperante nas universidades e nos laboratórios.
Entretanto, a Terra é um planeta pequeno, velho e com limitados recursos. Sozinha não consegue mais se autoregular. O estresse pode se generalizar e assumir formas catastróficas. Temos que reconhecer nosso erro: o de termo-nos afastado dela, esquecendo que somos Terra, que ela é o único lar que possuímos e que nossa missão é cuidar dela. Devemos faze-lo com a tecnologia que desenvolvemos mas assimilada dentro de um paradigma de sinergia e de benevolência, base da paz perpétua tão sonhada por Kant."

Comentários

dra.neurawm disse…
Ei!? Que surpresa boa para mim!!!
Não sabia que você gostava de Leonardo Boff, de suas idéias e de seus escritos!!! Leonardo Boff é meu conterrâneo. Nascemos na mesma cidade: Concórdia, Santa Catarina! Seus escritos, suas idéias, assim como os de Frei Betto, conjuntamente com toda os demais escritos do povo da Teologia da Libertação transcenderam a igreja católica e legaram à igreja luterana o movimento chamado Pastoral Popular Luterana, a PPL, que conheço bem, e que está muito presente até hoje nas comunidades evangélicas de confissão luterana no Brasil, especialmente no meio rural desse nosso vasto Brasil. Saiba mais sobre esse movimento nesse site: http://www.pastoral.org.br/

Legal você divulgar esse evento aí e incentivar o povo a assistir a fala dele.

Abraços com laços!
dra.neurawm disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
dra.neurawm disse…
Boff está naquela fase da vida em que os humanos atingem um grau de sabedoria transcendental. Estava esperando seu retorno. Obrigada!
E gostaria de complementar o comentário anterior, se você me permite esse espaço em seu blog.
Leonardo Boff recebeu do dia 15 de maio de 2008, das Faculdades EST (Escola Superior de Teologia) da Igreja Luterana a outorga do título de Doutor Honoris Causa. Esse foi seu primeiro título honorífico recebido de uma IES brasileira. Essa honraria foi um reconhecimento ao seu compromisso ecumênico, à sua reflexão entre teologia e ecologia, à sua produção científica, à importância que dá ao princípio protestante da indignação e a teologia luterana e à sua militância junto aos movimentos sociais.
Merecido reconhecimento, não acha?

Abraços com laços.

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